Tirinhas do Ganâncio

Originalmente publicadas no Jornal da Tarde em 2010, depois coloridas e republicadas no livro Trágico e Cômico em 2014 (o segundo da Trilogia de Charges), as tirinhas do Ganâncio voltaram para trazer um pouco de humor ao ciclo eleitoral de 2024.

Publicadas no Instagram, numa parceria com o INAC (Instituto Não Aceito Corrupção), cada tirinha trazia aquela sensação de “deja vu”, e não por já terem sido publicadas antes, mas porque repete aqueles mesmo roteiro do qual já estamos cansados de ver.

Abaixo segue um breve descritivo do personagem e, na sequência, todas as tirinhas que foram (re)publicadas.

Você provavelmente não conhece o Ganâncio, mas ele é daqueles políticos que te soa familiar. Candidato à re-re-re-re… (bom, você entendeu) re-re-reeleição para prefeito da cidade de Manquitolândia, ele ainda mostra a mesma sede pelo poder. Com 82 anos (66 de vida pública), ele não pensa em aposentadoria e avisa: “Eu não saio daqui nem morto! E quando eu morrer, serei o funcionário fantasma de mim mesmo!”.

De seu recém-reformado gabinete (cuja obra custou “módicos” 20 milhões), o líder do PCP (Partido do Coronelismo Pluralista) parece não se importar com a pilha de processos pendentes na justiça e fala sobre sua conexão com o povo de Manquitolândia. “Eu vim do povo. Eu sou o povo. Fui uma criança paupérrima que dividia uma casa grande de 12 quartos com meus pais e seis irmãos, e conheço as necessidades da senzala. Se o povo quiser um saco de farinha, eu dou. Se o povo quiser uns carguinhos no meu gabinete, eu dou. E eles votam em mim. É uma troca”, explica.

No Brasil, estamos acostumados a ouvir que “todos os políticos roubam”. Partindo dessa premissa, na hora do voto, já que todos roubam, por quê não votar naquele que rouba, mas pelo menos faz alguma coisa? Esse é o pensamento de muitos brasileiros
Ganâncio sabe como ninguém entender as “necessidades” do povo…
Em Manquitolândia funciona assim: se houver críticas a Ganâncio, é porque só pode ser coisa da “mídia golpista”. Quem já ouviu essa conversa antes?
Em Manquitolândia, Ganâncio sempre deu atenção especial às mulheres, mas nunca para assumir secretarias ou cargos importantes. Será que no seu município acontece igual?
Ganâncio se especializou na arte de falar apenas o que o povo quer ouvir. Mas esta suposta simbiose com o povo de Manquitolândia esconde alguns segredos de bastidor.
Alianças envergonhadas é sempre um tema delicado para candidatos em corrida eleitoral. Não para Ganâncio. A lógica é muito simples: quando o aliado incômodo for dos outros, é um conluio corrupto. Mas quando esse aliado estiver com Ganâncio, é só uma questão de pragmatismo e governabilidade. Deu para entender?
Tempo de campanha é tempo de ver como nossos candidatos são sensíveis às dores e aflições do povo. Seja na propaganda de TV, seja nas redes sociais, vale tudo para parecer ser “gente como a gente”.
Eleição também é tempo de publicação de dossiês (ou prints) e de grampos (ou áudios). Mas não importa o que apareça contra o Ganâncio, porque ele sempre terá uma “versão” melhor para apresentar ao público.
Você sabe qual é a ideologia de seu candidato? Para Ganâncio essa resposta é fácil: TODAS! É que ele criou um sistema de alta absorção, permeável a todas as ideologias possíveis. É por isso que ele está arrasando nas eleições deste ano (e em todas as que já passaram e também nas que ainda virão).
Sabe aquela história de defender uma pauta quando os microfones estão ligados e, nos bastidores, agir para derrubá-la? Então…
Nos anos 1980, em plena constituinte, Cazuza cantava sobre as desilusões políticas e queria uma ideologia uma para viver, enquanto que no mercado de capitais da realpolitik estavam querendo ideologias para comprar e vender.
Estimados eleitores, o resultado das urnas saiu sem surpresas: Ganâncio re-re-re-re-reeleito com votação esmagadora! Mas agora chegou aquela hora difícil de explicar ao eleitor que não vai dar para cumprir todas as promessas (até porque Ganâncio nem lembra direito delas!).