Quando o São Paulo conquistou o título do Mundial de Clubes de 1992, esta foto (imagem á esquerda) foi tirada ainda no vestiário do Estádio Nacional de Tóquio. Esta seria a imagem do Mestre Telê Santana que ficaria para a posteridade.
Em 2014, quando colaborava com a ESPN, fiz esta caricatura (imagem à direita) em cima da mesma foto, usando a técnica digital, para dar mais realismo ao desenho.
E em 25 de janeiro de 2023 foi inaugurada a estátua do Mestre, usando a mesma imagem como referência. Cinco meses depois, voltei ao Morumbi, depois de anos de afastamento forçado. Desde então não deixo mais de fazer a minha visita.
O título da Copa do Brasil, a meu ver, é apenas uma consequência natural dessa presença do Mestre na porta da nossa casa. Escrevi sobre isso nesta crónica, publicada na edição 896 do Anotações Tricolores, de Alexandre Giesbrecht.
Segue abaixo o texto completo.
Telê me fez voltar a crer no Clube da Fé
Certo dia, numa dessas conversas de bar, fui confrontado sobre uma contradição fundamental: como é que um ateu (não praticante, é bom dizer) e descrente sobre os rumos da humanidade, como eu, pode sucumbir às superstições do futebol?
Primeiro de tudo, é bom clarear alguns pontos. Minha descrença é tão enraizada que não consigo crer nem mesmo no ateísmo. Sou igual ao estado: laico. Rejeito cartilhas ideológicas e repudio qualquer submissão ou idolatria a supostos “enviados de Deus” e salvadores da pátria.
Porém, quando o assunto chega ao São Paulo Futebol Clube, me apego a místicas que não são próprias de um descrente. Como explicar? Fácil: minha idolatria por Telê Santana não tem efeito direto ou consequência alguma sobre outras pessoas. Porém, seu eu idolatrasse falsos profetas (religiosos ou ideológicos), eu estaria alimentando o monstro que nos devora por dentro.
Fiquei cinco anos e meio sem ir ao Morumbi, contando todo o período da pandemia. Foi o maior período afastado nesses 35 anos de torcida pelo Tricolor. Uma necessidade, para preservar a sanidade. A descrença em relação ao SPFC (por todos os problemas políticos e estruturais que passou) se estendeu ao futebol como um todo.
Minha volta ao templo aconteceu em 8 de junho deste ano, no jogo contra o Tolima pela Sula, que terminou 5 a 0 para nós. Ali inaugurei uma nova mística: em todo jogo que eu for, preciso visitar a estátua do Mestre Telê Santana e lhe pedir a bênção antes do jogo.
Não falhou nenhuma vez, seja em jogos da temporada regular, seja em mata-mata (incluindo a histórica final contra o Flamengo). Na semi contra o Corinthians, fiquei 15 minutos debruçado ali na grade, só contemplando, até ser interrompido pela PM.
Novo ponto de peregrinação entre tricolores, essa estátua tem um significado muito maior do que uma simples homenagem a um técnico vencedor. Ela nos ajuda a entender quem somos, quem fomos e quem queremos ser no futuro.
Desde o tri brasileiro em 2008, foram apenas dois títulos comemorados em forma de anticlímax. Na “Sula sem segundo tempo” e no “Paulista da covid” o grito não saiu como deveria. Seria coincidência comemorarmos um grande título em nossa casa apenas nove meses após a inauguração da estátua? Não acredito em coincidências.
Com a estátua, demos adeus a quinze anos de agonia e iniciamos uma nova era no clube. E exorcizamos, de uma vez por todas, aquela soberba “soberana”, que nos assombrou por todo este período. Aos que não sabem (ou não lembram), Telê era implacável com jogador arrogante metido a estrela, e não admitia falta de esportividade e nem qualquer tipo de menosprezo a adversários. “Não existe jogo fácil. O jogo torna-se fácil”, ele ensinava.
Quando estou acompanhando de um são-paulino da nova geração, faço sempre questão de explicar quem foi Telê Santana da Silva. Não era “deus”, no sentido bíblico do termo. Era um homem falível, como todos nós, com seus defeitos e contradições. Porém era um homem que prezava pelo bom futebol acima de tudo, que sempre brigava pelo que era certo, e cuja contribuição foi decisiva para nos tornarmos o clube gigante que somos hoje.
Sigo não acreditando em “Deus”, pois não há evidências de sua existência. Mas acredito em Telê Santana, porque fui testemunha. Esse cara existiu. Aquilo tudo aconteceu. Foi real. Está documentado.
Seguirei em minhas peregrinações a cada visita ao Morumbi, pois a simples presença de Telê ali na entrada – ainda que representada por uma estátua –, me fez recuperar a crença no Clube da Fé e renovou as minhas esperanças para os próximos anos.
Amém, Mestre… Obrigado sempre!
Aviso importante aos mais jovens: se dizer são-paulino e não saber quem é Telê Santana é a mesma coisa que dizer que ama a Apple e não saber quem é Steve Jobs. TEJEM AVISADOS!