Uma frase famosa, atribuída a Winston Churchill, diz que “A democracia é a pior forma de governo, com exceção de todas as demais”. Mesmo se pensarmos numa democracia que entregue o mínimo daquilo que promete, com seu sistema de freios e contrapesos funcionando a contento, ela já nos causa sentimentos que vão do tédio ao aborrecimento.
Agora, imagine a democracia brasileira, que vai chegando aos seus 40 anos ainda de fraldas (que precisam ser trocadas constantemente). Mesmo em seus melhores dias, a Nova República já se mostrava disfuncional, para dizer o mínimo. Os três poderes parecem atuar não para exercer suas competências de forma séria e independente, mas sim para construir agendas próprias e obter vantagens políticas (muitas vezes na base da chantagem).
Para o eleitor, a imagem que vem imediatamente à cabeça quando se fala em democracia é a da urna – e mesmo essa imagem foi vandalizada nos últimos anos. Hoje, o eleitor vê a democracia como um jogo que se vende como inclusivo, mas que, ao mesmo tempo, ele não se sente convidado a participar. Dessa forma, são inevitáveis questionamentos como: “por que devo defender este modelo de governo, se ele não me entrega nem o mínimo necessário?”. Ou ainda: “por que defender um sistema de governo que só tornou a minha vida pior?”.
Encaremos os fatos. Não é fácil responder a essas perguntas, principalmente para um povo que acha que a democracia deve existir para lhe servir, e não o contrário. Na cabeça do brasileiro, a frase de H. L. Mencken talvez faça mais sentido hoje: “A democracia é a arte de administrar o circo a partir da jaula dos macacos”.
Acontece que, se removermos a democracia e o sistema de três poderes – ou se deixarmos que esse sistema seja deformado, como aconteceu na Rússia e na Venezuela –, o poder executivo ganha superpoderes para governar sem freios nem contrapesos, tornando os outros dois poderes submissos e decorativos. E se a democracia já é problemática com os três poderes funcionando (ainda que mal); sem eles, fica muito, mas muito pior.
Mesmo assim, parece haver muita gente querendo pagar para ver Bolsonaro se tornando o Putin brasileiro e ordenando sua milícia a avançar contra todos que ele apontar como “comunistas”. No longo prazo, com a tragédia já instaurada, os mesmos que apoiaram tudo isso se fingem de desentendidos. Quem, eu? Imagina… Aí, quando recuperam aquele post antigo e comprometedor em sua rede social, o cara se sai com aquele típico migué brasileiro: “ai, mas eu não sabia que ia dar nisso”.
Para embolar ainda mais o meio de campo, hoje, defender a democracia se tornou algo tão genérico, que chegou ao ponto de ser contraditório, se pensarmos que os bolsogolpistas do dia 8/01/23 acreditavam estar numa missão divina “defendendo a democracia contra a ditadura do STF”. No fim, a “democracia” que esse pessoal defende é aquela da irônica frase do Millôr: “Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim”.
Dessa forma, proponho que o argumento seja diferente: vamos defender o sistema de três poderes, de uma forma que nenhum deles consiga atravessar o seu próprio espaço e que respeitem a existência um do outro. É por esse caminho que a discussão deve acontecer, caso você não queira voltar a ser assombrado por imagens como essa que ilustra o texto.